10 setembro, 2011

(Ím)Par

  Henrique sentia a cabeça dar voltas. Girando sem parar. A visão turva. Nenhuma imagem definida. Sentou-se no meio-fio. Colocou a cabeça entre os joelhos. Fechou os olhos. Respirou fundo. Imaginou uma bolha branca. A bolha que o envolvia, separando-o do mundo ao seu redor. Bolha confortável. Nela havia liberdade para pensar.

  Em um momento a ordem imperava. De repente o que era fixo já não era mais. O sol brilhava de forma diferente. Ele teria que se adaptar. Mas antes precisava adquirir a noção dessa necessidade. O que o chateava era começar de novo antes mesmo de estabelecer um fim. Foi um fim forçado. Ele não reagia bem a surpresas. Gostava de planos e rotinas. O momento de decisão era aflitivo. Ainda mais quando parte da decisão estava fora da sua vontade. Aceitar o disponível.
 
  Ergueu a cabeça. A lua estava cheia. Entendeu que não somente o mundo da lua era inconstante, mas a realidade também. Solidão. Ele queria segurar mãos que o compreendessem. A dor era imensurável. Queria pelo menos ter se despedido. Ter direito a um último beijo. Lara estivera chateada com ele. Henrique sentiu uma pontada no íntimo. Ele nunca mais teria uma chance de se desculpar. “Um acidente "_ foi a explicação dada. Deduziu que Shakespeare teria assassinado aquele maldito motorista sem ponderar. Sangue por sangue.

  Depois desse fim iminente, pensou que o melhor talvez fosse olhar somente para o passado. Se perder nas memorias. Pensou que Darwin não saberia como ele ainda estava vivo se não era forte o suficiente para adaptar-se.  Sentiu raiva das teorias. Aleatoriedade ou destino não o satisfaziam. Ele procurava a estabilidade. Mas o que parecia estável para o senso comum, lhe era monótono e deprimente. Mera ilusão. Ele não queria viver a vida que enxergava por aí. Procuraria o senhor do tempo. Seria um vagabundo como Sócrates. Vivendo de discursos e botecos. Ou poderia viver em torno da arte da dor. Lara o havia ensinado que ele tinha um coração. Nada mais digno do que mantê-la viva ali.


Licença Creative Commons
(Ím)Par de Brenda Ághata é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso não-comercial-Vedada a criação de obras derivadas 3.0 Unported.
Based on a work at vernizturquesa.blogspot.com.

2 comentários:

  1. A vida de Darwin foi marcada por descobertas e opressão.. chegou a ficar louco, mas não desistiu de realizar o seu propósito.

    Belo texto Brenda ^^

    ResponderExcluir
  2. This is the end
    My only friend, the end
    Of our elaborate plans, the end
    Of everything that stands, the end
    No safety or surprise, the end
    I'll never look into your eyes...again.
    http://www.youtube.com/watch?v=wRwwUZLV-IE&feature=related

    ResponderExcluir